34.Retratos do Brasil-v3-cap-10-m34
34. “Retratos do Brasil” (sem data).
É hoje o Brasil um lar de desgraça,
Cinema de farsa, teatro de embustes
Porão de famintos, vassalos e trustes
Cassino de jogos fedendo a trapaça
Os jornais enganam, a Globo não passa
De um laboratório de alienar
Tornou-se o Congresso um trono vulgar
De olhos que não veem e almas que não sentem
De corpos que luxam, de bocas que mentem
Dos dez de galope da beira do mar
Brasil que hoje em dia seus cidadãos sentem
Juros extorsivos, pesados impostos
De mentiras claras, de escândalos expostos
Que os grupos não cobrem por muito que tentem
E seus governantes calados consentem
Que dráculas de fora venham lhe sugar
E uma dívida externa quase secular
Que é paga com notas que são carimbadas
Com tinta do sangue das mãos exploradas
Dos dez de galope da beira do mar
As leis que nos regem são leis superadas
E obsoletas, repletas de emendas
E as nossas fazendas parecem fazendas
Mas são verdadeiras quadrilhas armadas
As terras existem, mas não nos são dadas
E os que lutaram pra nelas plantar
As armas do crime vieram calar
E hoje já não lutam, apenas esfriam
Debaixo da terra que tanto queriam
Dos dez de galope da beira do mar
Brasil de florestas que alguns negociam
De mães faveladas que estão nas sarjetas
Sem riso nos lábios, sem leite nas tetas
Pras bocas famintas dos filhos que criam
Que as nossas crianças sem pães se viciam
Nas sujas lições que o crime ensinar
São trinta milhões de filhos sem lar
Que a mãe é a noite, que a luz é a lua
Que o mestre é o mundo, que a casa é a rua
Dos dez de galope da beira do mar
Brasil de uma música que não é a sua
De alguns literatos apenas pseudo
De um rico Nordeste partido entre feudos
Mas que é proibido que o povo usufrua
De falsos políticos que o povo cultua
Porque foi castrado e não sabe pensar
De uma carta magna que era bom mudar
Que oprime o campônio, que esquece a mulher
Que lê quem tem tempo, que cumpre quem quer
Nos dez de galope da beira do mar
Brasil de heróis mortos que o povo ainda quer
E apesar de tudo homenageá-los
Que os livros da história hão de relembrá-los
Enquanto um resquício de honra ainda houver
Divina heroína, guerreira, mulher
Meiga como as flores e pura como ar
De Carlos Lamarca, de Pedro Pomar
Que acharam melhor morrer como bravos
Do que como a gente viver sendo escravos
Nos dez de galope da beira do mar
Brasil de três raças, de negros tão bravos
Guindastes humanos nos dias primeiros
Que foram nos sujos porões de cargueiros
Vendidos, comprados por míseros centavos
Plantaram, colheram, foram e são escravos
Que o negro não pode as algemas tirar
Argola ainda existe sem eles enxergar
E ainda é apátrida nas ruas, nas hortas
Uma gigantesca senzala sem portas
Nos dez de galope da beira do mar
Meu Brasil cafuzo por que não confortas
Teus índios que as matas foram para eles
Teto para o sono, mãe dos filhos deles
Na longa corrida do ouro estão mortas
Quem foi no passado senhor dessas hortas
É mero retrato de um livro escolar
Tomaram as reservas e deixaram o cocar
Quem foi dessas herdes senhor, dono e pai
Mendigam um pedaço de terra à Funai,
Nos dez de galope da beira do mar
Brasil de florestas que aos poucos se esvai
Por finos machados cortadas padece
E o seio da mata ferido estremece
E a cada pedaço de galho que cai
Que o seu solo sente que seu ouro vai
Para os que a devastam sem reflorestar
Daqui trinta anos sem árvore e sem ar
E em que nossos filhos serão transformados?
Se os nossos pulmões estão sendo arrancados
Nos dez de galope da beira do mar
Brasil das mentiras, dos Planos Cruzados
De escolas sem quase nenhum conteúdo
De cinco milhões de donos de tudo
E noventa e cinco de assalariados
De crimes impunes, de chãos violados
Com as veias abertas que estão a sangrar
De um povo que dorme mas quando acordar
Irá transformá-lo num templo de paz
Num Éden terrestre de homens iguais
Nos dez de galope da beira do mar