Autores: Haroldo de Campos e Gilberto Mendes. Intérpretes: Madrigal Ars Viva com regência de Roberto Martins. Gravadora: EMI Music. CD: Música nova para vozes (2000).
os sem-terra afinal
estão assentados na
pleniposse da terra:
de sem-terra passaram a
com-terra: ei-los
enterrados
desterrados de seu sopro
de vida
aterrados
terrorizados
terra que à terra
torna pleniposseiros terra-
tenentes de uma
vala (bala) comum:
pelo avesso afinal
entranhados no
lato ventre do
latifúndio
que de im-
produtivo re-
velou-se assim u-
bérrimo: gerando pingue
messe de
sangue vermelhoso
lavradores sem
lavra ei-
los: afinal con-
vertidos em larvas
em mortuá-
rios despojos:
ataúdes lavrados
na escassa madeira
(matéria)
de si mesmos: a bala assassina
atocaiou-os
mortiassentados
sitibundos
decúbito-abatidos pré-
destinatários de uma
agra (magra)
re (dis) (forme) forma
-fome- a-
grária: ei-
los gregária
comunidade de meeiros
do nada:
enver-
gonhada a-
goniada
avexada
-envergoncorroída de
imo-abrasivo re-
morso-
a pátria
(como ufanar-se da? )
apátrida
pranteia os seus des-
possuídos párias-
pátria parricida:
que talvez só afinal a
espada flamejante
do anjo torto da his-
tória cha-
mejando a contravento e
afogueando os
agrossicários sócios desse
fúnebre sodalício onde a
morte-marechala comanda uma
torva milícia de janízaros-ja-
gunços:
somente o anjo esquerdo
da história escovada a
contrapelo com sua
multigirante espada po-
derá (quem dera!) um dia
convocar do ror
nebuloso dos dias vin-
douros o dia
afinal sobreveniente do
justo
ajuste de
contas
Quando eu morrer, que me enterrem Na beira do chapadão -- contente com minha terra cansado de tanta guerra crescido de coração Tôo (apud Guimarães Rosa)
Zanza daqui Zanza pra acolá Fim de feira, periferia afora A cidade não mora mais em mim Francisco, Serafim
Vamos embora
Ver o capim Ver o baobá Vamos ver a campina quando flora A piracema, rios contravim Binho, Bel, Bia, Quim Vamos embora
Quando eu morrer Cansado de guerra Morro de bem Com a minha terra Cana, caqui Inhame, abóbora Onde só vento se semeava outrora Amplidão, nação, sertão sem fim Ó Manuel, Miguilim Vamos embora
Laço de índio eu vi, menino Virando lenda, picando limbo Pintando corpo com alma e festa Eu vi, eu vi, eu vi Vi curumim comer curimã Correr na manhã, esconder do fim Tocando uma pan para os passarinhos Eu vi, eu vi, eu vi
Pois passarinho é pra cantar Ó, menino Passarinho é pra voar Pois passarinho é pra voar Ó, menino Passarinho é pra cantar
Vi armar uma arapuca Com a isca do progresso Quem comer desse feitiço Desconhece o seu lugar
É isso que se tem pra dar
Ó, menino
O tal do civilizado
Na madrugada pega a poronga Sai na picada riscando o tronco Da seringueira, mãe da floresta Eu vi, eu vi, eu vi Vi o empate na derrubada A motosserra ficou calada Salvar a mata, salvar a pátria Eu vi, eu vi, eu vi
A morte defendendo a vida Ó, menino A morte de quem quer a vida A morte de quem quer a vida Ó menino A morte defendendo a vida
Um soldado que virou Seringueiro sem valor Hoje a pátria que conhece É a mata que restou A guerra não acabou por lá Ó, menino Pra quem vive e defende a terra